Actualmente, às finalidades tradicionais da contratação pública foram-se somando novas
preocupações. Aos poucos, foi-se tomando consciência de que a contratação pública, a
par dos seus objectivos imediatos, pode servir como instrumento de realização das mais
variadas políticas públicas, nomeadamente ambientais e sociais.
Na verdade, em 2014, em tempos de crise, percebe-se que, mais do que nunca, as entidades
públicas, enquanto entidades adjudicantes, têm a obrigação de exercer o seu poder de
compra de modo social e ambientalmente responsável.
Assim, uma forma de integrar as considerações ambientais e sociais na contratação pública pode ser, por exemplo,pelo contrato de empreitada de obra pública, que pode, ou melhor, deve ser encarado como um meio não apenas de obtenção da obra pública em si mesma
(permitindo a realização directa de determinado fim de interesse público), mas também como um instrumento de prossecução de políticas públicas ambientais.
A este propósito, mencione-se um dos princípios basilares do Direito do Ambiente: o princípio do desenvolvimento sustentável, expressamente consagrado no art.66º/2 da Constituição da República Portuguesa. Assim, embora inicialmente o seu alcance tenha sido de natureza económica, este obriga à fundamentação ecológica das decisões jurídicas de desenvolvimento económico, estabelecendo a necessidade de ponderar, tanto os benefícios de natureza económica, como os prejuízos de natureza ecológica de uma determinada medida, afastando por inconstitucionalidade a tomada de decisões insuportavelmente gravosas para o ambiente.
De facto, nos últimos anos, foi lançado um conjunto de iniciativas políticas específicas,
tanto a nível europeu como nacional, para incentivar a utilização dos contratos
públicos em apoio aos objectivos políticos já referidos, com destaque para os trabalhos
em curso no domínio da promoção dos contratos públicos ecológicos, da inclusão das
considerações sociais nos contratos públicos e do fomento da inovação. Na verdade,
para além do aperfeiçoamento do regime jurídico, as entidades europeias têm
investido em acções de formação, de divulgação e de esclarecimento das entidades
adjudicantes.
Ao celebrar contratos públicos ecológicos (Green Public Procurement), as
entidades adjudicantes públicas podem/devem reduzir o impacto ambiental das suas
próprias actividades (por exemplo, procurando reduzir as emissões de CO2 ou
promovendo a eficiência energética e a conservação dos recursos naturais) e, ao
mesmo tempo, podem/devem incentivar a inovação, influenciando o mercado no
sentido de este passar a fornecer produtos, obras e serviços mais ecológicos.
Basta ter presente a dimensão do universo da contratação pública, para
perceber o impacto (positivo ou negativo) que as (boas ou más) escolhas da
Administração Pública podem ter nestes (como noutros) domínios.
O "Green Public Procuremen"t é apenas um dos vectores de uma contratação
pública sustentável, já que a sustentabilidade da contratação pública não pode deixar
de ser vista nas suas diversas dimensões, sustentabilidade financeira, sustentabilidade
ecológica e sustentabilidade social, entre outras. E é verdade que, em época de crise, a
interacção entre estas diversas dimensões da contratação pública coloca novos e
difíceis desafios. Naturalmente, não se podem ignorar os riscos de que a introdução de
critérios verdes na contratação pública redunde em práticas discriminatórias ou em
fenómenos de corrupção. Ora, em tempos de crise, quando os recursos públicos afetos
à contratação pública são especialmente escassos, não são toleráveis quaisquer
desperdícios e, menos ainda, fenómenos de corrupção. Uma contratação pública sustentável exige assim, também, que a introdução de critérios ambientais ou sociais
num procedimento pré-contratual seja acompanhada de mecanismos de prevenção do
desperdício e da corrupção.
Em matéria de Green Public Procurement, são fundamentais as sinergias entre
o Direito dos Contratos Públicos e o Direito do Ambiente: o Direito dos Contratos
Públicos reforça os instrumentos do Direito do Ambiente e efectiva os seus
mecanismos, por exemplo, quando exige uma avaliação de impacto ambiental num
procedimento pré-contratual ou quando incentiva a utilização de rótulos ecológicos.
A fase inicial de um qualquer procedimento de formação de um contrato
público é o momento privilegiado para integrar as considerações ambientais e sociais.
A decisão de contratar, a definição das necessidades a satisfazer através do contrato, a
delimitação do objeto do contrato a celebrar são momentos decisivos, nos quais
devem ser chamadas à colação as referidas considerações sociais e ambientais.
O procedimento de formação de um contrato público inicia-se com a decisão de
contratar (Artº 36º CCP). Esta decisão deve basear-se numa correta avaliação das
necessidades de interesse público que justificam a celebração do contrato em causa. É
uma excelente ocasião para que a entidade adjudicante faça escolhas acertadas,
também do ponto de vista ambiental. Em relação a este aspecto em particular, o CCP é
omisso, mas obviamente que tais escolhas se impõem a partir dos próprios princípios
gerais da contratação pública e, em especial, do princípio da prossecução do interesse
público, do princípio da boa administração.
Alguns exemplos de escolhas que, neste momento inicial, faz sentido
que sejam tomadas em consideração, também à luz de critérios ambientais podem ser, mormente:
1) em primeiro lugar, ponderando se não existem alternativas à própria
celebração do contrato que permitam igualmente satisfazer a necessidade em causa,
embora com muito menos consequências do ponto de vista ambiental: por exemplo,
reutilizando determinados bens, em vez de adquirir novos; ou optando pela utilização
de meios desmaterializados de comunicação, em vez de celebrar contratos para
distribuição de cartazes, folhetos ou anúncios na imprensa escrita; 2) de seguida, prestando especial atenção às quantidades da compra: ao reduzir o
volume das compras ao estritamente necessário, está-se também, obviamente, a
reduzir o impacto ambiental a ela associado.
Fundamental é, do ponto de vista jurídico, a definição inicial do objecto do
contrato a celebrar. É o momento privilegiado para introduzir as considerações
ambientais e sociais de modo a marcar para todo o procedimento pré-contratual e o
contrato que, no final, se virá a celebrar e executar: por exemplo, tratar-se de um
contrato para aquisição de papel 100% reciclado.
Determinado, em termos gerais, o objecto do contrato, o seu conteúdo será
depois especificado através da elaboração do caderno de encargos e da definição das
especificações técnicas, local por excelência para a consagração de exigências sociais e
ambientais.
A este propósito, refira-se que a legislação ambiental condiciona, em diversos casos, as entidades
adjudicantes no momento da definição do objeto de determinados contratos e
respetivas especificações técnicas
Pense-se, por exemplo, na Diretiva 2002/91/CE, de
16 de Dezembro de 2002, relativa ao rendimento energético dos edifícios, a qual
condiciona as especificações técnicas dos contratos de obras novas e de reabilitação.
Tenha-se também presente a Diretiva 2010/31/EU, de 19 de Maio de 2010, que veio
estabelecer prazos para a realização de objetivos de rendimento energético (por
exemplo, no artº9º, 1 b) estabelece-se que, a partir de 2019, os edifícios novos afetos a
entidades públicas terão de ser edifícios de consumo quase nulo).
Importa ainda mencionar, a proósito da presente temática,a questão da eco- etiqueta, ou do rótulo ecológico.
Tal consiste num instituto criado pelo Regulamento do Conselho nº 880/92/CEE, de 23/3/1992, mas encontra- se actualmente regulado através da Posição Comum nº6/2000/CE, de 11/11/1999 e pelo Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho nº 1980/2000, de 17/7/2000.
A eco- etiqueta diz respeito a uma modalidade de prestação de informações e de orientações aos consumidores, de forma a promover produtos susceptíveis de contribuir para a redução de impactos ambientais negativos, por comparação a outros produtos do mesmo grupo, contribuindo deste modo para a utilização eficiente dos recursos e para um elevado nível de protecção do ambiente.
O que está aqui em causa é a combinação de um acto administrativo com um contrato e uma multiplicidade de actuações administrativas informais. Desta forma, a eco-etiqueta faz parte dos designados "instrumentos de mercado" para a protecção ambiental.
A Administração, para além de verificar a qualidade ambiental de um produto (através de uma actuação unilateral) e de promover a sua produção de forma ecologicamente sustentável (através de um contrato administrativo), vai também intervir no mercado mediante o fornecimento de informações aos consumidores, num mecanismo típico da moderna Administração infra- estrutural.
Esta intervenção administrativa, que decorre da atribuição de uma marca de garantia ambiental, visa assim combater a "desinformação" provocada pela utilização de técnicas publicitárias, uma vez que a etiqueta pressupõe,para os consumidores, a garantia pública e fidedigna de acreditação da composição e dos critérios de produção de um bem em face de uma publicidade eventualmente enganosa que utiliza distintivos ecológicos não normalizados.
Face ao exposto, conclui-se então pela extrema importância da tomada das atitudes mais adequadas, num mundo cada vez mais globalizado, onde há que pensar, não apenas no ambiente per si, mas também nas gerações vindouras.
Bibligrafia:
- Estorninho, Maria João, "Curso de Direito dos Contratos Públicos - Por Uma Contratação Pública Sustentável";1ªedição, Almedina
- Silva, Vasco Pereira, "Verde Cor de Direito- Lições de Direito do Ambiente, 2ª edição, Almedina;
-Amaral, Diogo Freitas do "Curso de Direito Administrativo Vol.II", ,2ª edição Almedina
Rafaela Pires, aluna nº 19820
Visto.
ResponderEliminarTem partes inteiras copiadas da Prof.ª Maria João Estorninho.
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