terça-feira, 25 de março de 2014

Análise geral dos princípios ambientais a luz do ordenamento jurídico brasileiro e português

1. Introdução
             Os  princípios ambientais são importantes, vistos que auxiliam a aplicação e a concretização do direito ao ambiental. Sendo assim, os princípios orientam tanto a atividade normativa, já que os legisladores devem emitir normas que efetivem os princípios, como juristas, já que auxiliam a interpretação de conceitos legislativos e sanam as lacunas destas, e como os administradores que estão vinculados ao princípio da legalidade, que não é apenas a submissão às leis mais ao direito ao seu conjunto. Logo, os princípios possuem um papel nuclear na caracterização do ordenamento jurídico, pois impede o surgimento de regras que lhes sejam contrários, compatibilizam a interpretação das regras e solucionam casos concretos na ausência de outra regra. Além disso, os princípios ambientais confirmam o entendimento que o direito ambiental é um ramo autônomo em face dos outros ramos do Direto.                                        
               Devido à importância dos princípios ambientais, esse trabalho tem como objetivo precípuo elencar e explicar alguns princípios que constam no ordenamento jurídico brasileiro e português. Como entende Celso Antônio de Mello os princípios jurídicos constituem o mandamento nuclear do sistema normativo, já que além de servirem de critério para a interpretação de todas as normas jurídicas eles têm a função de integrar e de harmonizar todo o ordenamento jurídico, transformando-o efetivamente em um sistema.                                         
Sendo assim, é fundamental conhecer os princípios do meio ambiente, visto que são importantes para o melhor entendimento e aplicação do direito ambiental.
2. Princípios no Ordenamento Jurídico Brasileiro e Português
2.1  Princípio ao meio ambiente equilibrado                                                                                 
                   Este princípio está relacionado com o princípio da sadia qualidade de vida, visto que uma vida com qualidade pressupõe um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Logo, o meio ambiente equilibrado é fundamental para a dignidade da pessoa humana. Com base nisso os organismos internacionais passam a medir a qualidade de vida não apenas por critérios econômicos e sociais, mas também como base no meio ambiente equilibrado.                                         
                  No entanto, medir isso é complicado, visto que é um conceito indeterminado e subjetivo. Logo, o conceito de meio  ambiente ecologicamente equilibrado varia de acordo com a cultura, uma vez que os limites para um ambiente ecologicamente equilibrado variam de acordo com estudo científico realizados em cada região.                                                                  
                   O princípio ao meio ambiente equilibrado é previsto na Declaração de Conferência da ONU do Meio Ambiente 72 ( ESTOCOMO 72).  Essa declaração criou critérios e princípios comuns para os povos do mundo terem um guia de preservação do meio ambiente. Tanto Brasil como Portugal segue essa declaração. Logo, esse princípio se encontra nos dois ordenamentos jurídicos. No direito brasileiro esse princípio se encontra positivado no caput do art. 255º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 ( CRBr./88) e no direito português se encontra positivado no art. 66º, n. 1 da Constituição da República Portuguesa  de 1974(CRP/74).
 2.2  Princípio do  desenvolvimento sustentável                                                                 
             O princípio do desenvolvimento sustentável é reflexo da tentativa de conciliação entre um meio ambiente equilibrado e o desenvolvimento econômico.  Sendo assim, estamos diante de um novo desenvolvimento econômico, onde existe a obrigação de se levar em conta o meio ambiente ao exercer uma atividade econômica.       Ou seja, antes de realizar um empreendimento é necessário observar a variante ambiental, analisando os impactos ambientais que serão acarretados a natureza na escolha dessa ou aquela atividade. Deve-se buscar a concordância dos dois direito em questão.                                                                     Na mesma linha de entendimento o professor Vasco Pereira da Silva afirma que este princípio obriga uma “fundamentação ecológica” das decisões jurídicas de desenvolvimento econômico, estabelecendo a necessidade de ponderar todos os benefícios de natureza econômica com os prejuízos de natureza ecológica.                                                                                         
              O principio do desenvolvimento sustentável também está previsto da Convenção de ESTOCOMO 72.  Esse princípio está previsto no art. 170º VI da CRBr/88 e na constituição portuguesa está prevista no art. 66º, n.º2, al. B.
2.3  Princípio do aproveitamento racional dos recursos naturais                                                
            O princípio do aproveitamento dos recursos naturais está relacionado com o princípio do acesso equitativo  ao recursos naturais. Ou seja,  ao explorar um recursos, renovável ou não, devemos explorá-los de forma a compatibilizar os interesses atuais com os futuros, permitindo que as gerações futuras possam ter acesso aos mesmos recursos que possuímos hoje. Logo, devemos aproveitar os recursos naturais de forma racional,  garantido o acesso equitativo dos mesmos para as gerações futuras.                                                                                          
           A referência mais importante ao princípio ao acesso equitativo aos recursos naturais no ordenamento jurídico brasileiro é a classificação do meio ambiente pelo caput do art. 225 da CRBr./88 como “ bem de uso comum do povo”. Além disso, o art. 5 CRBr./88 garante um tratamento isonômico. Ou seja, nenhum cidadão pode explorar um recurso natural de forma a impedir que outro tenha acesso. Já a Constituição da República de Portugal  esse princípioestá positivado no art. 66, n.2ºm al. d.
2.4 Princípio do Poluidor Pagador                                                                                        
         O princípio do poluído pagador tem como objetivo desincentivar abusos e impor limites  para garantir princípios igualmente importantes. Esse princípio é muito mais instrumental que material, visto que por meio deste garantisse a implementação do acesso equitativo aos bens e aos recursos e serviços ambientais e o aproveitamento racional dos recursos. Isso ocorre, uma vez que esse princípio internaliza as externalidade negativas, evitando a tragédia dos bens comum. Ou seja, os sujeitos econômicos que são beneficiários de determinada atividade devem ser responsáveis, pela via fiscal, no  que respeita a compensação dos prejuízo. Caso não ocorresse isso, os sujeitos econômicos maximizariam seus resultados levando ao total esgotamento – tragédia do bem comum.                                                                                
        O art.4º da Lei 6.938/81 – Política Nacional do Meio Ambiente- leva em contra que os recursos ambientais são escassos, portanto, sua produção e consumo geram reflexos que ocasionam a degradação ou a escassez. Ademais, utilizar os recursos gratuitamente caracteriza um enriquecimento ilícito, visto que é um bem comum do povo. Já a Constituição da República de Portugal prevê no seu art.66º, n.º2, al. h) o princípio do poluidor pagador.                                                                             
2.5 Princípio da Prevenção e da Precaução                                                                                                          Ambos os princípios possuem uma lógica preventiva, ou seja, é melhor tomar medidas preventivas do que depois tentar corrigir os danos ambientais. Uma parte da doutrina entende que há uma diferença entre o princípio da prevenção e da precaução, outra acredita que a precaução não é um princípio autônomo.                                                                                           
              O princípio da prevenção trabalha com uma certeza cientifica. Ou seja, há certeza que uma ação ou omissão “Y ocasionará um dano “X”. Nesse caso, impõe-se a proibição, mitigação ou compensação da ação ou omissão “Y” como forma de evitar o dano ambiental. Por outro lado, a precaução é uma ação preventiva sem base cientifica, mas deve ter uma base razoável. Sendo assim, impõe-se um critério valorativo e juízo de adequação acautelatório entre as informações disponíveis sobre a atividade e o dano.                Em relação ao princípio da precaução o Professor Vasco Pereira da Silva entende que:  preferível à separação entre prevenção e precaução como princípios distintos e autônomos è a construção de uma noção ampla de prevenção,adequada a resolver os problemas com que se defronta o jurista do ambiente. Sendo assim, percebesse que o professor entende que o princípio da prevenção deve ser visto de forma mais ampla.                                                            
        O professor utiliza três argumento para defender que o princípio da precaução não pode ser  autônomo: o primeiro tem natureza linguística, e oberva que para definir a palavra precaução precisa recorrer a noção de prevenção; o segundo de natureza material, que oberva a falta de critérios unanimes para diferenciar prevenção da precaução; e o terceiro de natureza formal.                                                                                                                                   
           No entanto, a Declaração do Rio de Janeiro,  voltada no âmbito da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, reunida no Rio de Janeiro, em 1992, estabelece em seu princípio 14 o da prevenção e no 15 o da precaução. Sendo assim, observa-se que a declaração trata os dois princípios de forma autônoma.  No entanto, o princípio da precaução não pode ser aplicado de forma plena, uma vez que é impossível ter “risco zero” quando se trata  de meio ambiente. Ademais, esse princípio deve ser compatibilizado com outros princípios constitucionais, como por exemplo, o do desenvolvimento econômicos. Logo, se adotarmos o princípio da precaução quando houver o mínimo de desconfiança não teremos desenvolvimento econômico.  Sendo assim, a razoabilidade deve sempre acompanhar o princípio da precaução.                                                                                                                                
            Os que defendem a autonomia do princípio da precaução, como por exemplo, Ana Goveira e Freitas Martins, estabelecem alguns argumentos, entre eles : é uma forma de estabelecer o nexo causal entre uma atividade e seus efeitos, tomando medidas para impedir a sua ocorrência. A antecipação preventiva é essêncial, uma vez que alguns danos ambientais são irrecuperáveis; possibilidade de inversão do ônus da prova, cabendo aquele, que pretende exercer determinada atividade demonstrar que os riscos associados e ela são aceitáveis;  in dúbio pro ambiente, ou seja, diante de determinadas situações é necessário fazer uma opção me beneficio ao meio ambiente;  e uma forma de incentivar desenvolvimento e introdução de melhores técnicas disponíveis.                                                                                             
             No ordenamento jurídico brasileiro podemos observar o princípio da prevenção no art. 4, I e IV, da Lei 6.938/81 e o caput do art. 225 da CRBr./88; e o princípio da precaução foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro a partir da ratificação de duas convenções: Convenção de Diversidade biológica e a Convenção sobre Mudanças Climáticas. Mas recentemente a Lei de Crimes Ambientais, Lei 9.605/98, estabeleceu em seu art.54,§3, o princípio da precaução.                                                                            No ordenamento jurídico português o princípio da prevenção está disposto no art. 66º,nº2, al. a), da CRP e na Lei de base do Ambiente, art. 3º, al. a). Já o princípio da precaução pode ser observado no direito europeu, uma vez que em 1992 o princípio da precaução ganha estatuto de princípio constitucional ao ser consagrado no Tratado da União Europeia. E em Fevereiro de 2000, a Comissão Europeia adota a célebre Comunicação sobre o Princípio da Precaução, em que convida os Estados Membros a reforçarem o conhecimento e promoverem a clarificação do princípio da precaução.                                       
2.6  Princípio da Responsabilização                                                                                            
                O agente causador do dano deve pagar pelo prejuízo que causou ao meio ambiente. O objetivo é retornar a forma anterior, dentro do possível, e quando não for possível retornar a situação original, visto que alguns danos ambientais são irreversíveis, deve haver uma compensação monetária.                                              Esse princípio está relacionado com o princípio da reparação previsto na Declaração do Rio/92, em seu princípio 13, que estabelece:  Os Estados deverão desenvolver legislação nacional à responsabilidade e à indenização das vítimas da poluição e outros danos ambientais.                                                    No direito brasileiro esse princípio está previsto no art. 14,§1º, da Lei 6.938/81, uma vez que prever a responsabilidade objetiva do poluidor pelos danos ambientais. Ou seja, esse terá que reparar integralmente o prejuízo causado, na medida do possível, independente de culpa. No art. 225,§3º, da CRBr./88 esse princípio também foi previsto. No ordenamento jurídico português esse princípio vem previsto no Decreto-lei nº 147/2008         
2.7 Princípio da Informação e da participação                                                                       
                     O princípio da informação ambiental é uma forma de conscientizar a população. Esse princípio se divide em três níveis de acordo com Canotilho, que são: o direito de informar, ou seja, liberdade de transmitir informação para outrem; o direito de se informar, que  a liberdade de buscar informação; e direito de ser informado, ser mantido informado pelos meios de comunicação disponíveis.  Sendo assim, os órgãos públicos têm o dever de transmitir as informações ambientais sistematicamente à sociedade civil.                                  O princípio da participação tem como objetivo incentivar o povo a participar das decisões referentes  ao meio ambiente. Sendo assim, um princípio interage com o outro, visto que não haverá participação sem informação e quanto maior for participação maior será a troca de informações. Além do mais, a informação e a participação são primordiais para a formação de uma opinião pública politizada capaz de se organizar e exercer os seus direitos dentro de uma democracia.                                                                      Na Constituição brasileira podemos verificar esse princípio decorre do princípio da publicidade ou da transparência previsto no caput do art. 37 da CRBr/88. Além disso, a Lei 6.938/81 instrumentaliza esses princípios em diversas artigos, entre eles o art. 4º, V,  e o art.9º , X e XI. Já a Constituição de  Portugal em seu art. 66 nº2  prevê o princípio da participação.
3. Conclusão
             Com base nos princípios arrolados neste trabalho, observa-se que os princípios ambientais são fundamentais efetivar o direito ambiental e formar diretrizes para aplicação de casos concretos. Sendo assim, fundamental analisar e entender cada um dos princípios apresentados acima.


Bibliografia
CANOTILHO, José Joaquim  Gomes; Leite, José Rubens Morato (Orgs.) Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007
Declaração do Rio de Janeiro, Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, reunida no Rio de Janeiro, em 1992. – Disponível em:< http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf> acesso em 13/03/2014
Constituição da República Portuguesa. Disponível em: < http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx > acesso em 13/03/2014
Constituição da Republica Federativa do Brasil. Disponível em: < http://comissoes.uepb.edu.br/cppta/?wpfb_dl=14 > acesso em 13/03/2014
SILVA, Vasco Pereira. Verde Cor do Direito; Lições de Direito do Ambiente 

NONE: Luana Vieira Coelho Gumes
ERASMU 







domingo, 23 de março de 2014

Avaliação de Impacto Ambiental



O instituto jurídico da avaliação de impacto ambiental nasceu nos Estados Unidos da América, através do National Environmental Policy Act (NEPA), de 1970.

Contudo, foi introduzido no continente europeu em 1985, com a aprovação da primeira Diretiva (n.º 85/337/CEE, do Conselho, de 27 de junho) sobre a avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente. Porém, em 1997, 2003 e 2009 sofreu diversas modificações, apesar de seu cerne ter sido mantido, várias normas ganharam nova redação e os anexos foram revistos e ampliados. Finalmente, em 2011, foi revogada a diretiva original e esta foi substituída por um novo diploma, que é a Diretiva n.º 2011/92/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que contém o regime atualmente em vigor na União Europeia em matéria de AIA.

             No ordenamento jurídico português, a obrigatoriedade da avaliação ambiental de determinados projetos foi originalmente estabelecida em 1990, através do Decreto-Lei n.º 186/90, de 6 de junho (que transpôs a Diretiva n.º 85/337/CEE e concretizou o artigo 30.º da Lei de Bases do Ambiente). Após, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 278/97, de 8 de outubro, que foi revisado pelo Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de maio, o qual também foi revisto e dado origem ao Decreto-Lei n.º 197/2005, de 8 de novembro (onde ocorreram as maiores mudanças).

Recentemente, o legislador aprovou o Decreto-Lei n.º 151B/2013, de 31 de outubro – que revogou e substituiu o regime de 2000, alterado em 2005 – e contém a disciplina jurídica atualmente em vigor no país quanto à AIA.

Segundo o professor Tiago Antunes “as principais alterações decorrentes do Decreto-Lei n.º 151-B/2013 dizem respeito ao procedimento administrativo propriamente dito, sistematizando melhor as várias fases ou etapas do mesmo, clarificando e, nalguns casos, reformulando o tipo de intervenção das várias entidades com competência na matéria, admitindo a execução de determinadas tarefas por entidades acreditadas, encurtando os prazos de decisão, prevendo uma tramitação desmaterializada, etc. No que toca ao âmbito de aplicação do instituto, foram modificadas algumas alíneas dos Anexos I e II (essencialmente no sentido de elevar limiares, de modo a excluir alguns projetos da necessidade de AIA) e introduziram-se pequenos acertos ou precisões quanto ao processo de seleção dos projetos a avaliar (screening), mas mantendo o cerne do modelo de 2005”.

Também refere o professor Vasco Pereira da Silva, que esse procedimento administrativo “destina-se a verificar as consequências ecológicas de um determinado projeto, procedendo à ponderação das respectivas vantagens e inconvenientes em termos de repercussão no meio-ambiente”. Ele refere também que é um meio jurídico ao serviço da realização dos fins ambientais, e em particular do princípio da prevenção, já que permite evitar ou acautelar possíveis lesões futuras do meio-ambiente, ao apreciar autonomamente as repercussões ambientais – presentes e futuras – de um projeto.

Pode-se dizer também que é um instrumento de realização dos princípios do desenvolvimento sustentável e do aproveitamento racional dos recursos disponíveis, pois através dele é realizada a análise e contraposição dos benefícios econômicos com os prejuízos ecológicos de um determinado projeto (sustentabilidade ambiental x desenvolvimento econômico).

Conforme o professor Tiago Antunes, a AIA é a peça central do ordenamento jus-ambiental, sendo “provavelmente o mais relevante e decisivo instituto jurídico do Direito do Ambiente”.

Esse instituto é considerado o mecanismo de controlo prévio de atividades potencialmente lesivas do equilíbrio ecológico e instrumento por excelência de concretização do princípio da prevenção. Tem carácter preventivo da política do ambiente, sendo realizados estudos e consultas, com participação pública e análise de possíveis alternativas, que objetiva o recolhimento de informação e identificação de efeitos ambientais de determinados projetos, propondo-se medidas que evitem ou minimizem esses efeitos.

A avaliação do impacto ambiental se traduz em aferir, apreciar e ponderar a relevância sobre o ambiente de projetos, públicos e privados, suscetíveis de terem nele consequências significativas, por força da sua natureza, da sua dimensão ou da sua localização, antes de serem autorizados ou licenciados.

“A avaliação do impacto ambiental deve identificar, descrever e avaliar de modo adequado, em função de cada caso particular, os efeitos significativos diretos e indiretos de um projeto sobre: i) “o homem, a fauna e a flora” – na proposta de diretiva de alteração da Diretiva 2011/92/EU, sobre a “população, saúde humana e biodiversidade, com particular ênfase nas espécies e habitats protegidos pela Diretiva 92/43/CEE do Conselho e pela Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho”; ii) “o solo, a água, o ar, o clima e a paisagem” – naquela proposta “terra, solo, água, ar e alterações climáticas”; iii) “os bens materiais e o património cultural” – na mesma proposta, “os bens materiais, património cultural e paisagem”; iv) e a inter-relação entre os mesmos; v) e ainda, naquela proposta, também, a “exposição, vulnerabilidade e resiliência dos fatores referidos … aos riscos de catástrofes naturais e de catástrofes provocadas pelo homem”.

Desta forma, observa-se a importância da existência e aplicação da AIA ao considerarmos os seus objetivos, que são:

  • Avaliar, de forma integrada, os possíveis impactos ambientais significativos, diretos e indiretos, decorrentes da execução dos projetos e das alternativas apresentadas, tendo em vista suportar a decisão sobre a viabilidade ambiental dos mesmos;
  • Definir medidas destinadas a evitar, minimizar ou compensar tais impactos, auxiliando a adoção de decisões ambientalmente sustentáveis;
  • Instituir um processo de verificação, a posteriori, da eficácia das medidas adotadas, designadamente, através da monitorização dos efeitos dos projetos avaliados;
  • Garantir a participação pública e a consulta dos interessados na formação de decisões que lhes digam respeito, privilegiando o diálogo e o consenso no desempenho da função administrativa. 
  • Obter um conhecimento antecipado sobre as consequências ambientais dos projetos, permitindo assim avaliar os custos ambientais de determinado projeto;
  • Garantir a adoção de decisões ambientalmente sustentáveis, através de uma correta ponderação e seleção de alternativas mais adequadas ao caso concreto;

Conclui-se, portanto que, a AIA visa proteger o ambiente contra consequências e efeitos negativos que decorram de um projeto. Não visa inviabilizar os projetos que venham a provocar tais consequências, mas sim previne essas consequências e tenta encontrar soluções para tais.

Bibliografia:

-  ICJP. Carla Amado Gomes e Tiago Antunes. E-book Revisitando a avaliação de impacto ambiental. Disponível no site http://www.icjp.pt/publicacoes/1/4539. Acesso em março/2014;

- Silva, Vasco Pereira. Verde Cor de Direito: Lições de Direito do Ambiente. Livraria Almedina, 2ª edição;

- Site: http://www.apambiente.pt/index.php?ref=17&subref=146. Acesso em março/2014.
Aluna: Joice Ceolin Poletto
Nº 24598

A Função dos Princípios da Precaução e da Prevenção nos Sistemas Clássicos de Responsabilização

  Relativamente aos princípios da precaução e da prevenção, entende-se que este último se dá em relação ao perigo concreto, enquanto o primeiro é dirigido ao perigo abstracto.
   O conteúdo cautelar do princípio da prevenção é dirigida pela ciência e pela detenção de informações certas e precisas sobre a periculosidade e o risco fornecido pela actividade ou comportamento, que, assim, revela a situação de maior verosimilhança do potencial lesivo que aquela controla pelo princípio da precaução. O objectivo fundamental perseguido na actividade de aplicação do princípio da prevenção é, essencialmente, a proibição da repetição da actividade que já se sabe perigosa.
   Aqui, a configuração do risco e os objectivos das opções cautelares são diferenciados, uma vez que não se actua para inibir o risco de perigo pretensamente imputado ao comportamento, ou o risco de que determinado comportamento ou actividade seja um daqueles que podem ser perigosos (abstractamente) e , por isso, possam produzir, eventualmente, resultados proibidos e prejudiciais ao ambiente, mas, pelo contrário, para inibir o resultado lesivo que se sabe possa ser produzido pela actividade. Actua-se assim, no sentido de inibir o risco de dano, ou seja, o risco de que a actividade perigosa (e não apenas potencialmente ou pretensamente perigosa) possa vir a produzir, com os seus efeitos, danos ambientais.A partir desta segunda hipótese de aplicação, percebem-se dois momentos diferentes:a aplicação do princípio da prevenção está circunscrita ao segundo momento, reservando o princípio da precaução ao primeiro momento.
   Desta forma, a orientação de proibição não é condicionada pelo risco de perigo potencial, que qualifica o comportamento objectado, afirmando que há risco de que o comportamento objectado seja perigoso. 
   Ao contrário da prevenção contra o risco, o objectivo deste princípio conserva traços de maior actualidade,cuja função é mais imediata e concreta. Objectiva-se a prevenção contra o risco de dano potencial, ou seja, contra o risco de potencial produção dos efeitos nocivos da actividade perigosa.
   A prevenção justifica-se pelo perigo potencial de que a actividade sabidamente perigosa possa produzir efectivamente os efeitos indesejados e, em consequência, um dano ambiental, logo, prevenindo um perigo concreto, cuja ocorrência é possível e verosímil, sendo, por essa razão, potencial. 
   A emissão dos efeitos poluentes ou degradadores pela actividade perigosa é potencial, provável e verosímil. Objectiva-se a prevenção ou a cautela contra o risco de dano ou lesão oriunda da possibilidade de que a actividade perigosa produza concretamente os efeitos nocivos proibidos.
   Desta forma, não basta simplesmente que se tenha a certeza do perigo da actividade, mas do perigo produzido pela actividade perigosa.
   Na situação de risco de perigo, há efectivamente um estado de perigo potencial que se quer prevenir;o perigo é potencial. Na situação de prevenção, não há qualquer traço de potencialidade em relação ao perigo; o perigo deixa de ser potencial.
   A este propósito, refira-se que, em ambas as situações, não é o estado ou a situação de risco de perigo que é potencial, o que é potencial é o perigo da actividade, ou o perigo produzido pelos efeitos nocivos da actividade perigosa. Logo, ou é possível que a actividade seja perigosa, ou é possível que essa actividade perigosa venha a poluir ou degradar.
   Refira-se que a investigação (avaliação dos riscos) é pressuposto relevante para o procedimento de aplicação do princípio da precaução, mas a justificação de medidas precaucionais não pressupõe que a investigação tenha sido exaustiva e conclusiva no sentido de identificar, demonstrar e caracterizar todos os riscos e os seus efeitos.
   Pode sustentar-se que, onde há controvérsia científica sobre a segurança do produto, actividade, técnica, método ou substância, a decisão autorizativa não pode prescindir de uma adequada avaliação científica disponível, cujo resultado, ainda que inconclusivo, será relevante para fundamentar, principalmente, a opção sobre qual a espécie e qualidade das medidas adequadas para a regulação do risco nesse momento, daí a importância da sua aplicação coordenada com o princípio da proporcionalidade.
   A forma de implementação do princípio da precaução precisa de ser definida tomando-se em consideração o contexto de uma sociedade mundial do risco, na qual se reconhece a incapacidade dos cientistas, na previsão e compreensão da realidade dos riscos.
   Assim, relativamente às condições de aplicação do princípio, também ser reconhecidas as limitações do conhecimento científico, sobretudo porque não possuem mais condições de prover o nível de informação adequado no momento oportuno, exigindo-se novas formas de implementação que permitam remover essa definição na orientação das decisões.
   A implementação do princípio da precaução deve ser realizada a partir de bases democráticas sólidas de gestão de informação, considerando-o como instrumento de gestão pro-activa do conhecimento, no qual a ciência compartilha hoje uma função que antes lhe era reservada com exclusividade:a de orientar de que formas as decisões sobre os riscos deverão ser tomadas.
   As medidas propostas devem representar decisões de elevada qualidade pública e plural, em cuja formação deve concorrer igualmente a intervenção da sociedade, uma vez que é a instância central na consideração e no julgamento sobre a tolerabilidade daqueles riscos.
   O princípio da precaução afirma que o preço da segurança não pode ser determinado pelas instituições e pelos especialistas. Os custos da segurança compreendem uma questão eminentemente social, que só pode ser decidida no espaço público e a partir de condições de elevada qualidade democrática, mediante garantia de uma participação adequada e de interferência oportuna nas decisões.
   A inversão do ónus da prova pela avaliação  dos riscos é também outra medida bastante representativa da aplicação do princípio da precaução e envolve o deslocamento da responsabilidade da produção das provas científicas, mediante a aplicação do princípio da autorização prévia para aqueles comportamentos ou actividades reputados como perigosos ou que inspiram maiores cuidados no controlo da liberdade de actuação.
   Contudo, de acordo com o princípio da proporcionalidade, entende-se que as medidas ou decisões tomadas devem não apenas ser suficientes, mas necessárias e adequadas a permitirem que o nível de protecção desejado seja atingido, de modo que não possam ser consideradas, em princípio, as orientações decisórias que indiquem que o caminho do non facere em atenção a uma pretensão de risco zero, elegendo como fundamento o estabelecimento de uma relação de absoluta hierarquia de que gozaria o bem ambiental.
   Assim, de acorso com as necessidades concretas de intervenção deve optar-se pela decisão que permita atender, de forma mais satisfatória, à redução ou eliminação daquela determinada e específica situação concreta de risco ou perigo, indicando medidas de redução, substituição ou interdição do comportamento perigoso e, em último caso, não pode vedar a possibilidade da busca do risco zero.
   Deste modo, tem-se que a incerteza não superada pelos procedimentos de avaliação de riscos não pode ser razão de justificação para obstar a implementação de medidas precaucionais. 
   De acordo com o princípio da proporcionalidade,a simples natureza da actividade não pode ser critério razoável para um tratamento excessivo.
   A protecção do ambiente não é, na relação de ponderação, hierarquizada em relação de precedência absoluta e exclusão prima facie, de pretensões e interesses de quaisquer naturezas. O que se exige não é a diminuição dos padrões de controlo ou o excesso, mas a imposição das medidas necessárias e adequadas à consecução dos mesmos padrões de qualidade ambiental.
   
   Por seu lado, o Professor Vasco Pereira da Silva, preferível à distinção entre prevenção e precaução como princípios distintos e autónomos, é a construção de uma noção ampla de prevenção, adequada a resolver os problemas com que se defronta o jurista do ambiente, pelas seguintes razões:

- de natureza linguística ,uma vez que a distinção entre prevenção e precaução parece assentar numa identidade vocabular, não se vendo vantagens em introduzir uma diferenciação aparente que encontra correspondência na linguagem comum,considerando, por isso, que o mais importante é ir "além das palavras", integrando no conteúdo do princípio da prevenção uma dimensão que permita abarcar tanto acontecimentos naturais como condutas humanas susceptíveis de lesar o meio- ambiente, sejam elas actuais ou futuras;

- de conteúdo material, dado que nem são unívicos os critérios de distinção entre prevenção e precaução, muito menos resultados a que conduz a autonomização desse último princípio cujo conteúdo pode ir desde uma sensata exigência de ponderação jurídica consideradora da dimensão ambiental dos fenómenos, até a interpretações eco- fundamentalistas susceptíveis de afastar qualquer realidade nova.
   Mais, as propostas de autonomização do princípio da precaução assentam em critérios muito diversificados, nem sempre permitindo separar de forma inequívoca os domínios correspondentes a essa nova realidade. Assim, o Professor não crê ser adequado distinguir o âmbito da prevenção em razão de "perigos" decorrentes de causas naturais e a precaução em função de "riscos", que seriam  provocados por acções humanas.
   Da mesma maneira, considera inadequado distinguir prevenção e precaução em razão do carácter actual ou futuro dos riscos, já que, no domínio das lesões ambientais, uns e outros se encontram interligados.
   Deste modo, o Professor considera que a melhor forma de defender o ambiente passa pela "filtragem", de acordo com regras de bom- senso, de algumas preocupações inerentes a essa tentativa de autonomização principal, adoptando uma noção ampla de prevenção;

- de técnica jurídica, uma vez que o ordenamento português eleva a prevenção à categoria de princípio constitucional,no art.66º/2 a) C.R.P. , com todas as consequências jurídicas que isso implica relativamente à actuação dos poderes públicos.
   



Bibliografia:

- Leite, José Rubens Morato/ Ayala, Patryck de Araújo, "Direito Ambiental na Sociedade de Risco", 2ª edição, Forense Universitária
- Silva, Vasco Pereira, "Verde Cor de Direito- Lições de Direito do Ambiente", Almedina



Rafaela Pires, aluna nº19820
   

O Princípio do Poluidor Pagador e a Responsabilidade Ambiental

O Princípio do Poluidor Pagador (PPP) surgiu na Recomendação C(72)128, de 26 de Maio da OCDE, onde se estabeleceu que “o poluidor deve suportar as despesas da tomada de medidas de controlo da poluição decididas pelas autoridades públicas para assegurar que o meio – ambiente se mantenha num estado aceitável”. Posteriormente, adquiriu consagração comunitária através do Acto Único Europeu. Actualmente, tem a sua sede no artigo 174º/2 do Tratado da União Europeia (TUE).
Porém, no Direito Interno, o PPP goza de natureza constitucional, uma vez que representa um corolário necessário da norma do artigo 66º/2, h), da Constituição da República Portuguesa (CRP), impondo ao Estado a tarefa de “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com ambiente e qualidade de vida”.
O PPP gira em torno da consideração de que os sujeitos económicos, sendo beneficiários de uma determinada actividade poluente, devem igualmente ser responsáveis, por via fiscal, no que respeita à compensação dos prejuízos que resultam para toda a comunidade do exercício dessa actividade.
Hoje em dia, essa perspectiva tem vindo a ser ampliada, no sentido de se considerar que uma tal compensação financeira, não se deve apenas referir aos prejuízos efectivamente causados, mas também aos custos da reconstituição da situação, assim como às medidas de prevenção que é necessário tomar para impedir ou minimizar comportamentos similares de risco para o meio – ambiente.
Para Alexandra Aragão, o PPP é um princípio nuclear da responsabilidade ambiental no âmbito do Direito Europeu.
O Sistema de Responsabilidade Ambiental é estabelecido na União Europeia através da Directiva 2001/35, de 21 de Abril de 2001. Em Portugal está consagrada no Decreto – Lei nº 147/2008, de 29 de Julho.
Os princípios ambientais que informam o regime da responsabilidade por danos ambientais são vários: o princípio do poluidor pagador, o princípio do desenvolvimento sustentável, o princípio da prevenção, o princípio da correcção na fonte e o princípio da integração. Estes princípios definem as linhas orientadoras tanto do regime europeu como do nacional.
Porém, apenas os princípios do poluidor pagador e o do desenvolvimento sustentável são expressamente considerados como princípios, de acordo com a Directiva europeia em causa.
No direito interno, o princípio da responsabilização social é mencionado através de uma remissão para a Lei de Bases do Ambiente. Este tipo de responsabilização, como está representada, valida apenas as actuações que decorrem após os danos ambientais terem ocorrido. Não configura as actuações preventivas, antes de se verificarem quaisquer consequências, consequências essas que estão visadas principalmente pelo novo sistema de responsabilidade ambiental. Por isso mesmo, a nível interno, temos mais uma configuração do regime da responsabilidade civil do que do princípio do poluidor pagador.
Contudo, de todos os princípios ambientais que têm uma ligação, directa ou indirecta, com a responsabilidade ambiental, é o PPP que é considerado como o princípio fundamental inspirado no regime em causa.
No direito nacional, o regime da responsabilidade ambiental tem uma disposição contraditória relativamente ao PPP: por um lado, este é o único princípio citado simultaneamente no preâmbulo e no texto legal; por outro, o princípio não se assume com a mesma convicção com que surge a nível europeu, na medida em que só é mencionado através da remissão para a Directiva.
O PPP, apesar de ser um princípio estruturante do Direito Europeu do Ambiente, surge, em todos os textos legais, sem uma definição legal, nomeadamente, a nível interno, na Lei da Água (Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro), no artigo 3º/1, c).
Ou seja: analisando o regime da responsabilidade ambiental, o que se pode concluir é que o PPP é considerado como o verdadeiro motor do regime ali instituído. Está-se perante um sistema cujo objectivo é fazer os poluidores pagar, em conformidade com as regras de justiça e eficácia, evitando, ao mesmo tempo, distorções de mercado.
Contudo, o caminho da Directiva é diverso: através do seu texto, conclui-se que, independentemente, de se saber qual a intervenção mais expedita ou mais eficaz, existe uma preferência, que se explica por razões de equidade, por fazer o poluidor suportar directamente as medidas reparatórias e/ou preventivas.
Com tudo isto, posso concluir que apenas esta solução corresponde à filosofia jacente no PPP. Trata-se de uma filosofia de custos, que acaba por ser mesmo a mais justa e também a mais eficaz, do ponto de vista ambiental.
Agora surge a questão: quem será o poluidor que deverá pagar? A Recomendação do Conselho nº 75/436, de 3 de Março, relativa à imputação dos custos e à intervenção dos poderes públicos em matéria de ambiente, define o poluidor como “aquele que degrada directa ou indirectamente o ambiente ou cria condições que levam à sua degradação”.
No artigo 2º/6 da Directiva em questão e no artigo 11º da lei nacional, o poluidor - operador é definido como “qualquer pessoa, singular ou colectiva, pública ou privada, que execute ou controle a actividade profissional ou, quando a legislação nacional assim o preveja, a quem tenha sido delegado um poder económico decisivo sobre o funcionamento técnico dessa actividade, incluindo o detentor de uma licença ou autorização para o efeito ou a pessoa que registe ou notifique essa actividade”. Através destes preceitos, posso concluir que é dispensada aqui uma análise caso a caso do responsável pelo dano potencial ou efectivo, através da imputação da responsabilidade para o operador – poluidor, o que pode gerar muitas vezes uma não correspondência entre o responsável financeiro e o responsável civil (que é o que efectivamente polui).
No Anexo III da Directiva encontramos uma listagem taxativa das actividades ocupacionais abrangidas. Esta lista tem como objectivo obrigar os Estados e criar para os operadores – poluidores o dever de prevenir e remediar os danos ambientais, nos termos previstos. Os operadores – poluidores que não estiverem mencionados no referido anexo estão abarcados por um dever de agir com zelo e diligência, na medida em que tal seja necessário para evitar danos nos habitats e nas espécies de fauna e flora selvagens.
Relativamente à responsabilidade plural mencionada na Recomendação de 1975, terá de se encontrar a responsabilização de cada um dos operadores – poluidores através de critérios justos e eficazes de imputação de riscos.
No Decreto – Lei nº 147/2008, as situações previstas de responsabilidade plural são: a responsabilidade de pessoas colectivas, a responsabilidade de grupos sociais, a responsabilidade de várias pessoas singulares e a responsabilidade de terceiros. Neste Decreto – Lei, está prevista então uma responsabilidade solidária, com um eventual direito de regresso.
Este tipo de responsabilidade solidária está directamente relacionada com a internalização de custos, dado que dá ao poludor, que paga por todos os outros, o direito de reaver dos demais poluidores, as suas partes do pagamento, repartindo assim os custos. Porém, a socialização de danos é prosseguida pela obrigação da criação de garantias financeiras, nomeadamente através da celebração de apólices de seguro que cubram as actividades abrangidas. Esta obrigação de criar garantias financeiras tem como objectivo evitar que os danos ambientais fiquem por reparar e são uma forma de manter uma pressão sobre o poluidor, incitando-o eficazmente a tomar medidas preventivas.
Surge-nos agora outra questão: o que deve pagar o poluidor? A resposta a esta questão encontra-se na Recomendação supra referida, referindo esta que o poluidor deve pagar as despesas das medidas necessárias para evitar essa poluição ou para reduzir, a fim de respeitar as normas e as medidas equivalente, permitindo atingir os objectivos de qualidade ou, quando esses objectivos não existam, a fim de respeitar as normas e medidas equivalentes.
Por outro lado, a Directiva supra referida, indica que o operador deve pagar os custos de prevenção e reparação dos danos, sublinhando que também se justifica que os operadores custeiem a avaliação dos danos ambientais ou, consoante o caso, da avaliação da sua ameaça iminente, instituindo assim uma espécie de “responsabilidade do futuro”, ou de evitar um enriquecimento sem causa do poluidor.
Entre as regras de prevenção e reparação vigora uma norma de subsidiariedade: primeiro devem ser adoptadas as medidas de prevenção e só depois as de reparação (caso as primeiras não sejam possíveis ou suficientes).
Dentro da prevenção encontram-se dois graus da mesma: o primário e o secundário. A prevenção primária consiste na adopção de medidas destinadas a evitar a ocorrência do dano. A preveção secundária consiste na adopção de medidas destinadas a não agravar um dano entretanto verificado.
Relativamente à prevenção, na nossa lei, encontramos uma distinção entre reparação primária, reparação complementar e reparação compensatória. Entre elas existe uma relação de hierarquia, atendendo à prioridade relativa.
Também é importante referir ainda relativamente a esta questão, que o operador – poluidor não paga os custos necessários para evitar ou reparar todos os danos causados ao ambiente. Paga somente aqueles danos eleitos pelo legislador como relevantes para serem abrangidos pelo regime em causa. Estes danos dividem-se em três categorias: danos às espécies e habitats naturais protegidos, danos à água e danos ao solo.
Por último, surge-nos outra questão: como paga o poluidor? De acordo com a Recomendação nº 75/436, o poluidor poderá pagar de duas formas: as normas e as taxas.
Por outro lado, no actual Regime da Responsabilidade Ambiental estão estabelecidas quatro formas diferentes de pagamento a imputar ao operador.
Porém, a regra de recuperação dos custos das intervenções públicas de protecção ambiental comporta várias excepções. Estas excepções reconduzem-se aos casos de danos directa ou indirectamente causados por terceiros e aos danos resultantes de actividades legais aparentemente seguras, desde que o operador – poluidor tenha actuado com diligência e de boa – fé.








Patrícia Tavares, nº 19802
23/03/2014

segunda-feira, 17 de março de 2014

A Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas nos Crimes Ambientais sob o Prisma da Legislação Brasileira

1.         Introdução.

Nesta postagem pretende-se, de maneira breve, analisar o instituto da Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas no cometimento de crimes ambientais sob a égide da legislação brasileira.

Tratar-se-à, sucintamente, da Teoria da Ficção Jurídica, de Savigny, e da Teoria da Realidade, de Otto Gierke, bem como do posicionamento das Cortes brasileiras a cerca do assunto, tomando como exemplo o memorável caso do derramamento de quatro milhões de litros de óleo cru por parte da empresa Petrobras nos Rios Barigui e Iguaçu, no Estado do Paraná.

2.         Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas nos Crimes Ambientais

A responsabilidade penal da pessoa jurídica foi prevista, pela primeira vez no Brasil, no art. 225, §3º, da Constituição Federal do Brasil de 1988, que dispõe:

Art. 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Ainda, atribuindo eficácia a tal previsão constitucional, tal responsabilidade passou a ser regulamentada via norma infra-constitucional, mais especificamente no art. 3º da famigerada Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9605/98):

   Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

Entretanto:

"Apesar de sua aplicação à tutela ambiental já estar indiscutivelmente firmada em nosso ordenamento jurídico legal - inicialmente, através do artigo 225, parágrafo 3º, da Constituição Federal e, posteriormente, pelo advento da Lei 9.605/98, denominada Lei dos Crimes Ambientais -, a discussão doutrinária a respeito de sua utilidade prossegue" (MPRS: A responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas nos Crimes Ambientais).

Nesta ótica, diversas correntes foram formadas ao longo da história, na tentativa negar ou viabilizar a aplicação da responsabilidade penal das pessoas jurídicas, entre elas, cito três:

1)             Corrente de postura mais radical: afirma que a Constituição Federal de modo algum criou responsabilidade penal da pessoa jurídica, pois, pela correta interpretação do art. 225, §3º da CF/88, consoante análise sistemática com as normas e fundamentos basilares do Direito Penal, conclui-se que a responsabilidade penal da pessoa jurídica não está prevista, uma vez que o parágrafo terceiro afirma, de maneira clara, que as condutas e atividades sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas. Logo, faz-se correto crer que, de acordo com a hermenêutica adequada ao ordenamento jurídico brasileiro vigente, o termo conduta esteja ligado às pessoas naturais, que devem ser devidamente responsabilizadas, enquanto o termo atividade esteja ligado às pessoas jurídicas, que devem sofrer sanções administrativas. Ainda, a atribuição legal de  responsabilidade penal da pessoa jurídica estaria, prima facie, em desacordo com o Princípio da Pessoalidade da Pena, exposto de forma expressa no art. 5º, XLV, da CF/1988, que diz:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-os aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade e à propriedade, nos termos seguintes:

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; 

2)             Corrente contrária mais famosa, desenvolvida por Savigny e Feurebach, que parte da famosa frase societas delinquere non potest, ou seja, a pessoa juridica não pode cometer crimes. Trata-se da Teoria da Ficção Jurídica.

A respeito desta Teoria, nos ensina Antônio Carlos Oliveira de Araujo:

 "A teoria da ficção, de autoria de Savigny, afirma que as pessoas jurídicas tem existência fictícia, irreal ou de pura abstração – devido a um privilégio da autoridade soberana – sendo, portanto, incapazes de delinqüir (carecem de vontade e de ação). Desse modo, para a teoria da ficção, só o homem é capaz de ser sujeito de direitos.

Savigny, ao negar a existência de um delito corporativo e impor a concepção romanista, excluiu por todo um século o problema. A ausência de responsabilidade penal da pessoa jurídica, que, desde há muito, predomina amplamente no Direito Penal de filiação romano-germânica, vem expressa na conhecida locução societas delinquere non potest."

Em outras palavras, pelo fato da pessoas juridica não possuir capacidade de conduta – vontade e consciência – está impossibilitada de agir com dolo ou culpa, não podendo, portanto, cometer crimes. Ainda, pessoas jurídicas são incapazes de agirem com culpabilidade e, partindo do princípio que esta é pressuposto da pena, seria necessária uma nova Teoria do Crime para justificar a responsabilidade penal das pessoas jurídicas.

A Teoria da Ficção, embora tenha sido alvo de diversas críticas, é ponto nevrálgico da discussão a respeito da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Entretanto, como o objeto deste post é analisar a responsabilidade penal das pessoas jurídicas nos crimes ambientais sob o prisma da legislação brasileira, creio que a aprofundação neste tema não se faz necessária.

3)             Por fim, há aqueles que acreditam que pessoa jurídica comete crimes. Para tal teoria, oposta à Savigny e Feuerbach, dá-se o nome de Teoria da Realidade ou da Personalidade Real, possuindo como patrono Otto Gierke.

Explica Antônio Carlos Oliveira de Araujo:

“A teoria da realidade, ou da personalidade real, cujo mais ilustre precursor se encontra em OTTO GIERKE, baseia-se em pressupostos totalmente diversos. A pessoa moral não é um ser artificial, criado pelo Estado, mas sim um ente real (vivo e ativo), independente dos indivíduos que a compõem. Do mesmo modo que uma pessoa física, atua como o indivíduo, ainda que mediante procedimentos diferentes e pode, por conseguinte, atuar mal, delinquir e ser punida. A pessoa coletiva possui uma personalidade real, dotada de vontade própria, com capacidade de ação e de praticar ilícitos penais. O ente corporativo existe, é uma realidade social. É sujeito de direitos e deveres, em consequência é capaz de dupla responsabilidade: civil e penal. Essa responsabilidade é pessoal, identificando-se com a da pessoa natural"

Assim sendo, pessoa jurídica comete crime, por não ser uma mera ficção legal, e sim uma realidade independente das pessoas que a compõe,  possuindo, portanto, vontade, não no sentido humano, mas no sentido de vontade autônoma de decisões. Segundo esta corrente, as pessoas jurídicas possuem culpabilidade social.

É nesta terceira teoria que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pautou sua posição, assegurando que pessoa jurídica pode ser sujeito ativo de crime.

Não obstante tal posicionamento, o STJ passou a adotar o o sistema de dupla imputação, onde, para que a denúncia contra pessoa jurídica  se torne válida, faz-se mister que a pessoa natural que ordenou ou atuou no crime ambiental também seja denunciada em conjunto, caso contrário a rejeição da denúncia será ocasionada.

Contudo, interessante caso moveu o Supremo Tribunal Federal a, paulatinamente, abandonar este posicionamento. Trata-se do famoso caso no qual a empresa denunciada – Petrobras – ocasionou o vazamento de aproximadamente quatro milhões de litros de óleo cru nos Rios Barigui e Iguaçu, no Estado do Paraná.

Entretanto, não foi possível apurar quem teria sido a pessoa (ou as pessoas)   diretamente responsável pelas atividades que desencadearam o acidente natural.

Retira-se do acórdão (Ag. Reg. No Rec. Extraordinário 548.181 Paraná):

“(...) é da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que a responsabilidade da pessoa jurídica exige a imputação simultânea da pessoa moral e da pessoa física que, mediata  ou imediatamente, no exercício de sua qualidade ou atribuição conferida  pelo estatuto social, pratique o fato crime, atendendo-se, assim, ao princípio do nullum crimen sine actio humana”

Contra este posicionamento, que ocasionaria o trancamento do processo, o Ministério Público Federal:

“(...) Argumenta ainda que a decisão do Superior Tribunal de Justiça, ao condicionar a persecução penal da pessoa jurídica à da pessoa física responsável individualmente pelos fatos, representaria negativa de vigência ao art. 225, § 3º, da Constituição Federal, que prevê a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crime ambiental sem este condicionamento. Na prática, o entendimento geraria impacto na eficácia da responsabilização penal da pessoa jurídica, já que não raras vezes, por questões probatórias, seria impossível identificar, no âmbito da empresa, a pessoa física especificamente responsável pelo delito ambiental.”

Por fim, conclui a relatora, Senhora Ministra Rosa Weber:

"Por seu turno, eis o teor do § 3º do art. 225 da Carta Política de 1988:

 “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

(...)

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativa, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

Da leitura do preceito acima, em cotejo com as razões de decidir que desafiaram o extraordinário, entendo presente questão constitucional maior, qual seja a do condicionamento da responsabilização da pessoa jurídica a uma identificação e manutenção, na relação jurídico-processual, da pessoa física ou natural, exigência que me parece não existir no art. 225, § 3º, da Constituição Federal. Nesse contexto, julgo merecer provimento o agravo regimental, a fim de assegurar o processamento do recurso extraordinário, viabilizando a esta Suprema Corte melhor exame da questão constitucional debatida. Ante o exposto, voto pelo provimento do agravo regimental. É como voto."


Em suma creio que o presente post tenha sido suficiente para provar o quão rico porém complicado e polêmico é este tema. Por fim, embora diversos posicionamentos contrários adotados, entre os quais os de Savigny e Feurebach,  conclui-se que o ordenamento jurídico brasileiro, consoante interpretação do art. 225, §3º da Constituição Federal, adotou entendimento a favor da responsabilidade penal das pessoas jurídicas exclusivamente nos crimes ambientais e, ainda, de acordo com a jurisprudência exposta, percebe-se que os Tribunais vêm se mostrando cada vez mais aptos e dispostos a dar a interpretação mais extensiva possível a tal preceito constitucional, de forma a assegurar a proteção do meio ambiente para as gerações atuais e futuras do modo mais eficiente possível.



Fontes

- Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul: A Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas nos Crimes Ambientais, Doutrina. Disponível em: http://www.mprs.mp.br/ambiente/doutrina/id379.htm. Acesso em 17.03.2014.

- MACIEL, Silvio. Legislação Penal Especial. Disponível em http://pt.scribd.com/doc/72248411/Legislacao-Penal-Especial-Silvio-Maciel . Acesso em 17.03.2014.

- ARAUJO, Antonio Carlos Oliveira. Responsabilidade da pessoa jurídica. Disponível em http://www.advogado.adv.br/artigos/2001/araujo/respenalpessoajuridica.htm. Acesso em 17.03.2014.


- SILVA, Eduardo & TREVIZAN, Penitente Victor. Artigo: STF muda critérios para processo da pessoa jurídica. Disponível em http://www.conjur.com.br/2013-set-01/decisao-stf-altera-criterios-processo-penal-pessoa-juridica.Acesso em 17.03.2014.



Aluno: Matheus Martins Costa Mombach
N. de aluno: 24594
ERASMUS BRASIL