A duplicidade do
regime do Regime Jurídico da Responsabilidade por Danos Ambientais
Cumpre aqui analisar o regime jurídico a
responsabilidade por danos ambientais, mais concretamente, a ambivalência do
seu regime e algumas das principais características do mesmo.
O Regime Jurídico da Responsabilidade
por Danos Ambientais (RJRDA) é actualmente regulado nos termos do DL n.º
157/2008, de 29 de Julho. Este regime da responsabilidade surge no âmbito de
uma Directiva Comunitária, Directiva n.º 2004/35/CE.
É de salientar que o RJRDA não tem um
conteúdo totalmente coincidente com o da Directiva, devido a diferentes
perspectivas do nosso legislador. O RJRDA vai numa direcção mais ampla,
abrangendo não apenas a prevenção e reparação de danos ecológicos puros mas
todo o tipo de danos que os particulares possam efectivamente vir a sofrer,
permitindo-lhe exercer o seu direito a uma indemnização.
Estamos assim perante dois tipos de
responsabilidade, uma civil liga a uma visão mais clássica da nossa doutrina e
uma responsabilidade administrativa. Contudo, o que se trata nesta última é de
responsabilidade civil que é moldada por normas administrativas.
A primeira aproxima-se da
responsabilidade civil do nosso Código Civil, em concreto artigo 483.º e
seguintes. Existem dois sujeitos, o autor da lesão e o lesado, sendo que o primeiro
tem de reparar o dano ao segundo, na medida da sua responsabilidade.
A responsabilidade administrativa a que
é feita referência comporta uma outra dimensão. Na medida em que outrem (o
operador), que não é efectivamente responsável pelos danos causados, esteja
obrigado, nos termos do Capitulo III, a prevenir e a reparar esses danos.
A Directiva tem como finalidade de
reparação dos danos causados à natureza (danos ecológicos puros), sendo que o
RJRDA tem outro, o de permitir a que sejam reparados danos patrimoniais
pessoais, que ocorrerem por meio de uma lesão do ambiente. Para efeitos da
Directiva o dano ambiental comporta três dimensões: i) os danos à
biodiversidade; ii) os danos à água; e iii) os danos ao solo. Não se encontram
directamente abrangidos os danos ao ar ou à atmosfera, mas apenas e só quando
os mesmos causem danos aos bens ambientais anteriormente expressos.
O RJRDA comporta dois tipos de
responsabilidade. O capítulo III (artigo 11.º e seguintes) vem aplicar o regime
da Directiva, tendo em vista a protecção da natureza. O capítulo II (artigo 7.º
e seguintes) diz respeito à ressarciblidade dos danos pessoais, sendo que aqui
entramos no âmbito de uma verdadeira responsabilidade civil tradicional, que
abrange todos os danos de que a pessoa seja alvo por via de uma lesão ao
ambiente. Contudo, temos sempre de atender à possibilidade de o próprio lesado
ter concorrido para a produção ou agravamento do dano, o que leva a que a
responsabilidade seja reduzida ou diminuída (artigo 9.º RJRDA).
A Directiva, e consequentemente o
capitulo III do RJRDA, tem subjacente uma lógica preventiva, devendo dar-se preferência
à prevenção em vez da reparação, uma vez que esta última pressupõe a existência
de um dano ambiental, por mais pequeno que seja. O regime tradicional de
responsabilidade civil não tem efectivamente uma ideia de prevenção, a não ser
num sentido dissuasor da prática de determinado facto, passível de causar
danos.
Nos termos do capítulo III do RJRDA e da
Directiva a reparação deverá ir no sentido de recolocar os recursos naturais no
seu estado primitivo, como se nunca tivessem sofrido algum tipo de lesão (estaríamos
no âmbito da reparação primária, ao qual o Anexo V, no seu ponto 1.2, do RJRDA faz
referencia, bem como a Directiva no seu Anexo II).
É
patente que o que se pretende é uma reparação in natura e não uma reparação de âmbito pecuniário, uma vez que o
próprio regime determina que não existe direito a indemnizações. O objectivo fundamental
é proteger e preservar o máximo possível os ecossistemas que nos rodeiam
tentando coloca-los, em caso de lesão, na exacta situação antes de a mesma ter
ocorrido.
Este é um regime de responsabilidade
civil algo particular, uma vez que o objectivo é que o operador, no exercício das
suas actividades tenha sempre em atenção quais as consequências que poderão
advir da sua actividade, devendo por isso tomar medidas de prevenção para que não
se verifiquem danos ambientais (artigo 14.º, do RJRDA) e reparar possíveis danos
que, infelizmente, possam ocorrer (artigo 15.º, do RJRDA). Estamos perante uma
responsabilidade de âmbito preferencial preventivo.
Nos termos do capítulo II, do RJRDA, a
situação é distinta. O que se trata aqui é de uma verdadeira responsabilidade
civil, onde o fim último é a compensação de uma pessoa pelos danos que possam
ter ocorrido na sua esfera jurídica, pessoal ou patrimonial. Portanto, é aqui
se admite a indemnização dos danos causados a terceiros com base numa lesão ao
ambiente. A indemnização é, pelo menos tendencialmente, pecuniária. Todavia, tal
pode ser realizada de outra forma desde que no fim se atinja a satisfação do
lesado, cobrindo efectivamente o prejuízo causado.
Ou seja, no âmbito deste Capitulo não
consideramos o Anexo V do RJRDA, uma vez que este apenas diz respeito à
reparação dos danos ambientais e que exclui as compensações por danos pessoais.
Aqui temos, sem dúvida alguma, uma responsabilidade preferencialmente
ressarcitória.
Temos um ponto coincidente nestes
regimes, que reside na existência de modelos de responsabilidade que variam
consoante a actuação do agente. Estamos a falar natureza subjectiva e
objectiva.
A subjectiva está relacionada com uma actuação
dolosa ou negligente de um sujeito, ao passo que na objectiva, independentemente
da sua actuação o agente irá responder por aqueles danos, mesmo que tenha
cumprido todas as regras de prevenção. O que aqui se deixa transparecer é a importância
dada ao tipo de actividade que está a ser praticada, neste caso uma actividade perigosa
que só pelo simples facto de estar a ser exercida comporta um elevado risco de
causar danos, devendo por isso o seu operador suportar todos os custos daí
advenientes, reparando o dano.
A responsabilidade objectiva está
patente nos artigos 7.º (capitulo II) e 12.º (capitulo III), do RJRDA, sendo
uma responsabilidade onde o elemento – a culpa – é dispensado. Para aferirmos este
tipo de responsabilidade temos de atender ao Anexo III, do RJRDA, que determina
quais são os tipos de actividades que são vistas como práticas perigosas, na
qual o operador fica imediatamente abrangido por este tipo de responsabilidade.
Estes operadores têm uma responsabilidade de larga escala, uma vez que estes
terão de tomar todas as diligências necessárias para prevenir danos e efectuar
qualquer tipo de reparação possível face a esses danos.
Por oposição, a responsabilidade de tipo
subjectivo já tem em consideração o elemento – a culpa. Está patente nos
artigos 8.ºe 13.º, do RJRDA. Esta responsabilidade vai abranger todos aqueles
operadores que realizam uma actividade não constante do Anexo III e, portanto,
uma actividade não perigosa, face ao determinado neste Regime. Para a
determinação da sua responsabilidade já vamos atender à sua conduta, nomeadamente
se actuou de forma negligente ou mesmo dolosa. Esta abrange qualquer tipo de
danos ecológicos puros, por oposição àquilo que fora determinado pela Directiva,
que apenas abrange os danos à biodiversidade.
Bibliografia:
Antunes, T. (2014). Pelos caminhos jurídicos do
ambiente - verdes textos I. AAFDL.
Gomes, C. A. (2009).
A responsabilidade civil por dano ecológico : reflexões preliminares sobre o
novo regime instituído pelo decreto lei nº 147/2008 de 29 de Julho . O
Direito, pp. 127-161.
Margarida de Lemos Palmeiro, aluna n.º 20779
Visto.
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