domingo, 18 de maio de 2014

O Fundo de Intervenção Ambiental enquanto instrumento financeiro

O Fundo de Intervenção Ambiental, doravante designado por FIA, foi criado pelo n.º1 do artigo 69.º da Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto. O seu Regulamento consta do Decreto-Lei nº 150/2008, de 30 de Julho e a Portaria nº 485/2010, de 13 de Julho, aprova o Regulamento de Gestão do Fundo de Intervenção Ambiental, o qual vem “definir o procedimento de apresentação e selecção de projectos, as regras de pagamento, as regras de reembolso e a remuneração dos montantes de financiamento.”[1]

O FIA consiste num instrumento financeiro público que decorre do princípio do poluidor-pagador, na medida em que se atende a uma mutualização do risco ecológico. O princípio do poluidor-pagador “tem garantia constitucional, uma vez que representa um corolário necessário da norma do artigo 66º, nº2, alínea h), da Constituição, que impõe ao Estado a tarefa de “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com ambiente e qualidade de vida.” O princípio determina que “os sujeitos económicos, que são beneficiários de uma determinada actividade poluente, devem igualmente ser responsáveis, pela via fiscal, no que respeita à compensação dos prejuízos que resultam para toda a comunidade do exercício dessa actividade.”[2] Contudo, como em certos casos de afectação do ambiente [3] não se pode imputar alguém em concreto, o Fundo garante não apenas a reparação do dano, mas também a indemnização do lesado e a correcção de eventuais danos ecológicos. No fundo, trata-se de um recurso colectivo para a reparação de danos ambientais.

“O FIA tem por missão financiar iniciativas de prevenção e reparação de danos a componentes ambientais naturais ou humanas[4], resultantes de actividades lesivas para o ambiente. O FIA ocupa-se primordialmente de danos ambientais que exijam uma intervenção rápida ou para cuja prevenção ou reparação não se encontrem vocacionados outros instrumentos públicos, reforçando com meios de financiamento próprios a actuação de diversas entidades (...)”[5].

Nos termos do Regulamento de Gestão do FIA, os projectos apoiados são referentes a[6]:
Ø  Prevenção de ameaças graves e iminentes a componentes ambientais, naturais ou humanas

Ø  Prevenção e reparação de danos a componentes ambientais naturais ou humanos resultantes de catástrofes ou acidentes naturais


Ø  Eliminação de passivos ambientais

Ø  Reparação de danos ambientais cuja prevenção não possa ser concretizada nos termos gerais do regime de responsabilidade civil[7] ambiental


Ø  Actuação em quaisquer outras situações de mora, dificuldade ou impossibilidade de imputação ou ressarcimento de danos a componentes ambientais naturais ou humanos

Este tipo de instrumentos públicos financeiros tem verificado um vasto alargamento no Direito Ambiental Português, possuindo “particular importância a criação de fundos públicos autónomos, alimentados por receitas próprias, capazes de acorrer às situações de desastre ecológico ou de passivo ambiental mais urgentes.
Na substância, as funções do FIA inspiram-se em boa medida em figuras análogas existentes no plano internacional, como sejam o Fundo Internacional para a Compensação pelos Prejuízos Devidos à Poluição por Hidrocarbonetos e o Fundo Internacional Complementar para Compensação pelos Prejuízos Devidos à Poluição por Hidrocarbonetos. Para além destes, podemos referir o Hazardous Substances Superfund norte-americano ou os diferentes fundos ambientais que existem no Direito Brasileiro.
Deste modo, visando garantir a máxima eficácia do Fundo, faz-se uma articulação com “outros fundos públicos, de direito nacional, comunitário ou internacional, que tenham como objectivo a prevenção e reparação de danos ambientais ou a concretização de políticas associadas à defesa do ambiente.”[8]

“O financiamento do FIA assenta na atribuição a este de uma percentagem das coimas provenientes da comissão de contra-ordenações ambientais, solução já prevista pela Lei nº 50/2006, de 29 de Agosto. A isto acrescem receitas de diversa natureza, como a participação na cobrança de taxas, indemnizações e compensações devidas ao Estado ou a actores populares em virtude da lesão ou perigo de lesão de bens ambientais ou os valores arrecadados em virtude da sub-rogação do FIA perante os agentes causadores dos danos que tenham determinado a sua intervenção.”[9] O artigo 6º do DL 150/2008, de 30 de Julho enumera as receitas que podem ser tidas em consideração para efeitos do FIA.

Nas palavras de CARLA AMADO GOMES, “proteger o ambiente – gerir racionalmente recursos escassos e promover a sua qualidade regenerativa – é tarefa árdua e cara. Árdua, porquanto a gestão racional implica refreamento de hábitos de consumo de realidades que se pensava, há menos de um século, serem infinitas; cara, porque manter o padrão de progresso económico salvaguardando o ambiente, implica investimentos vultuosos em técnicas que permitam reduzir os impactos poluentes e mesmo reconversão de métodos de funcionamento e produção.” [10] Quer isto dizer que é absolutamente necessário apelar à responsabilidade social na dimensão de protecção do ambiente, adoptando mecanismos de command and control, de modo a alcançar uma política de promoção ambiental eficaz. O FIA serve como instrumento de consciencialização e, de certo modo, deriva da solidariedade intrageracional, numa acepção de responsabilidade por interesses colectivos, nomeadamente o ambiente.







[1] In http://www.apambiente.pt/index.php?ref=17&subref=162&sub2ref=483

[2] Vide VASCO PEREIRA DA SILVA, “Verde Cor de Direito – Lições de Direito do Ambiente”, Almedina, 2002. p 74 e 75

[3]“ Quando os custos não podem ser imputáveis ao responsável pelo dano ambiental, quando surgem dificuldades de prova relativamente à culpa do causador do dano, (...) quando surja uma dificuldade em fazer funcionar o instituto da responsabilidade ou em obter ressarcimento por falha na cobertura deste risco através do recurso ao mercado segurador, ou ainda nos casos em que o responsável não dispõe de capacidade financeira para reparar, eliminar ou compensar um dano (...)” – in http://pegadas-ecologicas.blogspot.pt/2012/05/fundos-ecologico-o-fundo-de-intervencao.html

[4] Preâmbulo da Portaria nº 485/2010, de 13 de Julho

[5] Preâmbulo do DL nº 150/2008, de 30 de Julho

[6] In http://www.apambiente.pt/index.php?ref=17&subref=162&sub2ref=483 (referente ao artigo 3º do DL nº 150/2008, de 30 de Julho)

[7]“ O facto de a Constituição instituir o ambiente como bem jurídico e de incluir a sua protecção no conjunto das tarefas do Estado enunciadas no artigo 9º não determinaria, por si só, a necessidade de construção de um sistema de sancionamento diverso do civil, maxime penal.” In, CARLA AMADO GOMES, “Introdução ao Direito do Ambiente”, AAFDL, Lisboa 2014, p. 208

[8] In http://www.cinfu.pt/index.php/component/content/article/48-agosto-08/145-fundo-de-interven-ambiental-entra-em-vigor- (referente ao rtigo 3º, nº2 do DL 150/2008, de 30 de Julho)

[9] Preâmbulo do DL nº 150/2008, de 30 de Julho

[10] CARLA AMADO GOMES, op. cit. p 221 


Maria Lourenço
nº20944

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